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Kill Bill - pt I

"If you want revenge, you have to be willing to kill God and even the Buddha"

Filme nº 1005
Kill Bill : Volume 1 (Kill Bill)
Ano: 2003
Diretor: Quentin Tarantino
Duração: 111 min

Kill Bill: Volume 1 Poster
Originalmente, Tarantino havia pensado em lançar Kill Bill como um único filme, mas ele acabou ficando muito extenso e teve que ser dividido em duas partes, a exemplo do meu post.
A obra do diretor faz referência à inúmeros filmes (mais de 160), reproduzindo tanto cenas quanto suas tramas e trilhas sonoras. Ele mesmo o admite escancaradamente, como disse em entrevista à Empire Magazine, certa vez: "Eu roubo de todo filme já feito [...] Se meu trabalho tem algo é tirar isto daquilo e aquele de outro e misturar tudo junto".
E ele o faz de forma genial, em um mosaico que fãs de seus filmes esforçam-se para reconstituir na internet comparando o sucesso do diretor à longas principalmente dos anos 60 e 70, incluindo temas como zumbis, samurais, vinganças, faroestes e muita violência gratuita.
Surgiu até um rumor algum tempo atrás, segundo o qual o cineasta daria 1 milhão de dólares a quem nomeasse cada uma de suas referências. Desafio árduo. O vídeo chamado Everything is a Remix: Kill Bill, feito por Kirby Ferguson e Robert Grigsby Wilson revela algumas recriações feitas pelo diretor. Existem também teorias acerca da ligação curiosa que ele faz através de sua filmografia, uma delas discutida por Selton Mello e Seu Jorge no curta O Código Tarantino (2006).


A ideia para o longa foi criada pelo diretor e a atriz Uma Thurman enquanto gravavam Pulp Fiction em 1994; aparentemente os dois começaram a conversar sobre o tipo de filmes que gostariam de fazer futuramente e Quentin declarou que desejava realizar um baseado em kung fu ao estilo dos anos 70. Eles falam sobre em The Making Of Kill Bill, onde a atriz conta ter imaginado as cenas de abertura, com a noiva ensanguentada. Nos créditos finais aparece a sigla "Q e U" referente à dupla. 

Inclusive em uma das cenas do cultuado filme do diretor, Mia Wallace conta ter participado de um piloto de tv no qual fazia parte de uma equipe de agentes secretas chamado Fox Force Five, que parece descrever as personagens femininas do Esquadrão das Víboras Assassinas.


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                                                   Existia uma loira, ela era a líder.

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                                                    A japonesa era uma mestre kung fu.

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                                             A garota negra era especialista em demolição.

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                                                   A especialidade da francesa era sexo.

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                  A personagem que eu interpretava era a mulher mais fatal do mundo com uma faca.

O time que segue as ordens de Bill e é formado principalmente por mulheres, sofreu influência de várias gangues ficcionais retratadas anteriormente no cinema, como a de Faster, Pussycat! Kill! Kill! (1965) de Russ Meyer e Faca na Garganta (1975). Este último até foi relançado pela extinta Rolling Thunder Pictures, com comentários de Tarantino, grande fã do longa de Jack Hill. Go girls!


 
Trio formado por Lori Williams, Haji e Tura Satana.


                                                                  As Dagger Debs

Inspirados em 'O Clã do Veneno', lutadores do filme Os Cinco Venenos de Shaolin (1978), o grupo formado por Copperhead/Vernita Green, Cottonmouth/ O-Ren Ishii, Californian Mountain Snake/ Elle Driver, Sidewinder/Budd, Black Mamba/Beatrix Kiddo e Snake Charmer/Bill tem como codinomes os mesmos usados pelos inimigos do Capitão América nos quadrinhos.


                                         Personagens de Kill Bill acima e cena de Os Cinco Venenos de Shaolin abaixo.

A identidade da noiva não é revelada no primeiro filme, sendo dublado por um apito toda vez que é pronunciado por alguém, apologia a 'trilogia dos dólares' de Sergio Leone, no qual o personagem principal é "o estranho sem nome"; além de Made in U.S.A. (1966).


Clint Eastwood em Um Punhado de Dólares

Segundo Thurman, o diretor lhe fez assistir a 3 filmes como preparação: O Matador (1989), de John Woo, Coffy: em Busca de Vingança (1973), de Jack Hill, com a atriz (1) Pam Grier, a mesma de Jackie Brown (1997) e Por um Punhado de Dólares (1964), de Sergio Leone.
Estrelado por (2) Raquel Welch e dirigido pelo britânico Burt Kennedy, Hannie Caulder - Desejo de Vingança (1971) também fez a cabeça do diretor para compor sua personagem principal.
Já o longa de 1968 dirigido por François Truffaut, A Noiva de Preto, conta a história de uma mulher interpretada por (3) Jeanne Moreau que fica viúva bem no dia de seu casamento e emprega uma missão de vingança similar à da protagonista de Kill Bill.



    
                                                      (1)                                                      (2)                                                (3)

Francis Bacon cunhou pelo menos três provérbios sobre vingança, argumentando que "Vingança é um tipo de justiça selvagem", "Um homem que estuda vingança mantém suas feridas verdes" e finalmente que a "Vingança triunfa sobre a morte". Aparentemente o roteiro de Tarantino segue todas elas fielmente. Ele introduz os primeiros frames com o dito "Vingança é um prato que se come frio" atribuindo-o à um antigo Provérbio Klingon (língua falada em Star Trek). Ué, tem alguma coisa errada aqui. Provérbio Klingon? Então, no segundo longa da série, A Ira de Khan, lançado em 1982, o personagem referenciado no título questiona : "Ah, Kirk, meu velho amigo, você conhece o provérbio Klingon que diz...?" Talvez essa tenha sido a forma do diretor mostrar o quanto é nerd e tirar sarro do próprio tema que propõe.


Algumas fontes apontam para o romance de Pierre Chordelos de Laclo, Ligações Perigosas, 1782. Porém a frase "La vengeance est un plat qui se mange froide" não se encontra no texto. Outra referência enganosa. De novo, não acredite em tudo que você ler.
Um exemplo real parecido com o citado é de outro autor francês, Eugène Sue, em Memórias de Matilda, publicado em 1846 : "Então vingança é muito agradável saboreada fria, como os vulgares costumam dizer." O Don Corleone de O Poderoso Chefão declara algo parecido no filme de 1969; " Vingança é um prato saboreado melhor quando frio".


 "Do you find me sadistic?
 [...] You, know, Kiddo, I'd like to believe that you're aware even now to know that there's nothing sadistic in my actions.

 [...] No Kiddo, at this moment, this is me at my most...

                                                             [cocks pistol] masochistic. "




Ao apontar uma arma para a cabeça de Beatrix Bill recria a cena em que Tuco (Eli Wallach) prepara-se para matar Blondie (Clint Eastwood) em Três Homens em Conflito (1966), de Leone. Já a silhueta da noiva que aparece em seguida com fundo acinzentado é homenagem ao clássico de Orson Welles, Cidadão Kane (1941), conhecido por suas inovações em fotografia, edição e som. A cinematografia de Kill Bill ficou nas mãos de Gregg Toland, que trabalhou também no horror expressionista Dr. Gogol O Médico Louco (1935).




-2-

Quando enxerga seus algozes, a câmera faz um close dos olhos da noiva (recurso do qual o diretor faz uso repetido em sua filmografia, veja aqui) e a visão da heroína fica vermelha como nos filmes de faroeste cultuados pelo diretor, a exemplo de A Morte Anda a Cavalo (1966); A coloração é usada para evocar sentimentos de raiva e necessidade de extravasar emoções através da violência, funcionando como forma de ativar nossas percepções e colocar-nos imediatamente em alerta. Nestes flashbacks, a música tocada é o tema da série Ironside (1967).




Parece que a aguardada continuação da série Kill Bill não terá Thurman como protagonista, mas sim a filha de Vernita Green (Vivica Fox), Nikki (Ambrosia Kelley) já crescida e querendo vingar a morte da mãe. Segundo Tarantino"Sofie Fatale vai pegar todo o dinheiro de Bill e criar Nikki, que irá atrás da Noiva. Nikki merece sua vingança tanto quanto a Noiva mereceu a sua."
Aliás, Nikki ou Nikkia parece um diminutivo de Nikita, filme famoso dos anos 90 sobre uma assassina sensual, dirigido por Luc Besson. 


Beatrix pede uma xícara 'com leite e açucar' ao aceitar o café oferecido por Vernita, assim como o Mr.Wolf (Harvey Ketel) de Pulp Fiction. Outra recriação é quando a personagem toca a campainha da casa, cena idêntica a de Atirem no Pianista (1960). Já as tomadas feitas de cima são inspiradas em O Escândalo (1967).

                                                                         Uma Thurman acima e Harvey Ketel abaixo.

A discussão entre as duas sobre seus codinomes no Esquadrão das Víboras Assassinas é similar ao que se dá entre Mr. Pink e Mr. Brown em Cães de Aluguel (1992).

  
Gif de Vivica Fox em Kill Bill e cena de Reservoir Dogs ao lado

Outra referência à um de seus filmes é o quadradinho desenhado por Uma Thurman, em contextos diferentes. Em Pulp Fiction forma-se um retângulo na tela, mas não se esqueça que todo retângulo é um quadrado. (As pinturas na casa de Vernita são do artista Rodney Grier).

Uma Thurman em  Kill Bill x Pulp Fiction

O nome do cereal que a personagem estava servindo para sua filha e na qual esconde uma arma chamava-se 'Kaboom', fazendo um paralelo à participação de Tarantino em um episódio de The Simpsons no show de Comichão e Coçadinha intitulado 'Reservoir Cats'. Em uma fala ele declara que a "[...] violência está em todos os lugares na nossa sociedade [...] inclusive no nosso cereal matinal, cara." A fala de Lucy Liu ao final do filme: "Silly Rabbit, Trix are for kids"  é uma referência à uma marca de cereais, assim como ao nome da noiva.

Kill bill Tarantino Tomy y Daly cereal

A ideia de listar os nomes dos que a violentaram em um caderno foi tirada dos filmes A Mulher do Fazendeiro (1928), um dos primeiros de Hitchcock e Os Violentos Vão para o Inferno (1968), de Sergio Corbucci.


-The Blood Spattered Bride-

Inspiração para o título do segundo capítulo, o thriller gore La Novia Ensangrentada (1972) oscila entre mitos, violência e fantasias sexuais bizarras nas mãos do espanhol Vicente Aranda.
A fileira de óculos que aparecem no carro do xerife são uma recriação da cena de abertura do filme de corrida 60 Segundos (1974), de Halicki, diretor que repete a imagem depois em Junkman (1982).


O personagem Earl Mcgraw (Michael Parks), que investiga o massacre na capela, é o mesmo morto no início de Um Drink no Inferno (1996) pela dupla vivida por George Clooney e Quentin Tarantino.

À esquerda o ator em Kill Bill e à direita em From Dusk Till Down.

Enquanto locomove-se no hospital, Elle Driver (Daryl Hannah) assobia a  mesma música entoada por Hywel Bennett em A Morte tem Cara de Anjo (1968), composta por Bernard Herrmann, que teve suas canções usadas em trilhas de filmes como Cidadão Kane (1941), Psicose (1960) e Taxi Driver (1976). A cena em si foi tirada de Marnie (1964) com Tippi Hedren.


Seu caráter e visual foram inspirados nas personagens de Faca na Garganta e Thriller - Um Filme Cruel (1974), respectivamente interpretadas por Monica Gayle Christina Lindberg. O longa do sueco Bo Arne Vibenius (abaixo) foi banido em seu país devido às sequências explícitas de violência e sexo.


No documentário The Making Of Kill Bill (2003), Tarantino afirmou que o recurso da tela dividida em dois foi uma homenagem à Brian de Palma, que o utilizou em filmes como Carrie (1976), Olhos de Serpente (1998) e Paixão (2012). 


O codinome de Elle -  California Mountain Snake - inspirado na Lampropetis zonata multicincta, é a única dos 5 integrantes que não é venenosa. Propositalmente, Elle é interrompida por Bill antes de injetar veneno na veia de Beatrix. Lembrando as cores da espécie  que empresta-lhe o apelido, seu figurino de enfermeira foi concebido por Catherine Marie Thomas, que também adaptou o conjunto usado por Beatrix, sendo indicada ao Guild Awards pelo seu trabalho nos dois filmes de Tarantino. Logo tornando-se incrivelmente reconhecida e requisitada no meio cinematográfico, ela também colaborou com o guarda-roupa de filmes como Vestida para Casar (2008), Whip It (2009) e ganhou um prêmio no mesmo ano pelas composições presentes em Grey Gardens.

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      Darryl Hannah, Christina Lindberg em Thriller e cena de Audition (1999) abaixo.

Aparentemente o reflexo de cuspir da noiva enquanto está em coma foi tirado do horror australiano Patrick (1978). Já a frase utilizada pelo enfermeiro vivido por Michael Bowen; "My name is Buck and I'm here to fuck."  é bem parecida com a fala de abertura do ator Robert Englund em Eaten Alive (1977).
Michael Bowen em cena de Kill Bill

Tanto em Kill Bill quanto em Pulp Fiction, a personagem de Thurman acorda assustada; no primeiro do coma e no segundo, de uma overdose. Logo após acordar, ela finge estar ainda em coma, esperando a hora certa para matar seu violador, parecida com a cena do filme Lobo Solitário III : Contra os Ventos da Morte (1972), em que uma prostituta arranca a língua de seu cafetão, o qual morre após alguns segundos sangrando; tal fato acontece também em Female Prisoner #701: Scorpion (1972).




Os óculos que a personagem pega do bolso de Buck, são do mesmo estilo usado por Christian Slater em Amor à Queima Roupa (1993), que teve o roteiro escrito por Tarantino.
O termo 'Pussy Wagon', nome do carro de Buck, aparece no final da letra de 'Grease Lightning' cantada por John Travolta no clássico de 1978. O Chevrolet Silverado SS pertence à Tarantino na vida real, que o emprestou para ser usado no clipe de TelephoneJá bem conhecido entre os cinéfilos fãs do diretor, seu fetiche por pés sempre figura algumas cenas dignas de recordação em seus filmes. Aqui Tarantino usa a paralisia muscular da personagem para dar um close nessa parte do corpo, recriando um episódio da série Alfred Hitchcock Presents chamado Breakdown (1955) e de Asas de Águias (1957), em que a protagonista também fala com os próprios pés.


Base para a construção da personagem vivida por  Lucy Liu e seu passado traumático, o filme Lady Snowblood - inspirado no mangá de Kazuo Koike, autor também de O Lobo Solitário - conta a história de Yuki (Meiko Kaji), cujo único propósito é acabar com aqueles que assassinaram brutalmente sua mãe; violência recriada pelos inimigos da Noiva.


Inicialmente Tarantino pretendia escalar uma atriz japonesa para o papel de O-Ren, mas depois de assistir Bater ou Correr (2000), ele mudou de opinião e decidiu contratar a americana descendente de chineses, chegando a mudar as origens de sua personagem no roteiro.


-The Origin of O-Ren-

Influenciado por O Fantasma do Futuro (1995) de Mamuro Oshii, trama que igualmente gira em torno de uma órfã assassina e Blood: The Last Vampire (2000), de Hiroyuki Kitakubo, originado do mangá de mesmo nome escrito por Benkyo Tamaoki, Tarantino contratou o estúdio de animação Production I.G. para trabalhar em Kill Bill, o mesmo responsável pelas duas animações. O diretor confessou em uma conversa com o indiano Anurag Kashyap ter sido inspirado por seu filme Abhay (2001), em que algumas cenas de violência são animadas.


"Take a good look at my face.
                                              Look at my eyes. 
                                                                  Do I look familiar?
                                         Do I look like somebody...
                                                                   you murdered?"

A fala da personagem de O-Ren Ishii jovem (dublada no desenho por Ai Maedaprestes a matar o homem que tirou a vida de sua mãe, é praticamente a mesma dita pela assassina vingativa do filme japonês de 1973, que aliás também recebeu uma sequência animada.



-The Man from Okinawa-

A ilha de Okinawa é famosa entre os japoneses pelo péssimo Sushi, então Tarantino decidiu que era um ótimo lugar para o ex-fabricante de espadas samurai esconder-se daqueles que poderiam eventualmente procurá-lo. O ator Sonny Chiba, que dá vida à Hattori Hanzo, também ocupa-se da manufatura das katanas na vida real; além de ser faixa preta em várias artes marciais japonesas. Aliás, vários diálogos referenciam o filme de Fukasaku, Portal do Inferno (1981) e a série de televisão dos anos 70 Kage no Gundam, na qual o ator interpreta o personagem lendário de mesmo nome, do qual seria descendente em KB. O nome de Hanzo pode ser traçado até 4 ninjas japoneses da era feudal, porém o mais famoso nasceu no século 16, um excelente estrategista e mestre no uso de lanças, assim como fundamental na inauguração do período da história japonesa chamado Tokugawa ou Edo (1603-1868).



A discussão que se dá entre ele e o assistente, que diz "Se estes fossem os militares, eu seria general agora!", é tirada quase que palavra por palavra de Fighting Back (1948). 
Aqui, como nas cenas passadas no hospital, o uso da cor branca é predominante, representando a perfeição e paz no momento em que Beatrix recebe a espada das mãos de Hanzo e isolamento e frieza nas sequências protagonizadas por Hannah.

                 "If, on your journey, you should encounter god, god will be cut"
Mencionado em Kill Bill, Kato era o personagem vivido pelo ator de filmes de ação e kung fu Bruce Lee em Besouro Verde, que inspirou as máscaras usadas pelos The Crazy 88, A música que escutamos quando Beatrix viaja para Tóquio e anda de moto é o mesmo do tema da série de televisão dos anos 60.


Na cena em que O-Ren comemora sua ascenção como líder, a personagem veste um kimono preto, conhecido como 'kurotomesode', o mais formal das vestimentas japonesas, usado apenas por mulheres casadas, com mangas curtas. Mas ela faz as próprias regras, inclusive na indumentária, criada pela figurinista Kumiko Ogawa, inspirada pela Era Meiji (1867-1902), fase de modernização japonesa governada pelo imperador de mesmo nome. A estilista também colaborou com o longa Shinobi (2005). A música intitulada Ode to O-Ren Ishii  é uma versão da usada em Premonição (1977).


Assim como nos filmes violentos nipônicos com cenas de luta entre samurais, o sangue não escorre, mas jorra dos corpos dos personagens, a exemplo de Sanjuro (1962), do mestre Kurosawa. De acordo com o artista de efeitos de maquiagem Christopher Allen Nelson, cerca de 450 galões de sangue falso foram gastos ao longo dos dois filmes. Uma das técnicas usadas pelo americano, que recusou as tecnologias modernas para efeitos especiais, foi um velho truque disseminado pelo chinês Chang Cheh em seus filmes de artes marciais; preenchendo um preservativo de sangue que ficava na mão do ator que iria morrer, que no momento certo apertava o 'dispositivo' e o líquido começava a fluir.


-Showdown at House of Blue Leaves-

Após ter assistido ao ator Jun Kunimura gritando no filme de Takashi Miike, Ichi, O Assassino (2001), Tarantino o escalou para viver o chefe Tanaka, que questiona a autoridade de O-Ren em uma reunião. Lucy Liu parece recriar a cena presente no início do filme de Kazuo Mori, Zatoichi (1962).

                                     Cena de Kill Bill acima e de Goke abaixo


A paisagem alaranjada na cena em que Beatrix encaminha-se para Tokyo é recriação da sequência de abertura da ficção científica Goke (1968), de Hajime Satô. Uma das cenas que tem como cenário a cidade de Hong Kong parece ser uma reciclagem do filme Godzilla (2001), cena montada em miniatura com edifícios feitos de cartolina. Aparentemente são também referências para a construção do local : A Invasão dos Gargântuas (1966) e O Despertar dos Monstros (1968) ambos do japonês Honda, especialista em filmes com monstrengos atacando cidades grandes;

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                                Gif comparando cena de Godzilla e Kill Bill


Curiosidade: A marca de cigarros Red Apple é uma invenção do diretor, que aparece em vários de seus filmes. A modelo no cartaz atrás de Beatrix é a atriz Julie Dreyfus, a mesma que interpreta a protegida de Bill, Sofie Fatale.


O túnel em que Beatrix atravessa de moto é na verdade a entrada para o túnel localizado em Los Angeles que aparece em Blade Runner (1984), com placas de sinalização japonesas acrescentadas.



música tocada pela banda feminina 5.6.7.8's foi ouvida pelo diretor pela primeira vez quando estava em uma loja de roupas e ele achou que se encaixava perfeitamente no filme. Todas as músicas delas, inclusive "Woo Hoo" são covers de singles de surf dos anos 60. O figurino e cenário usados para as meninas também é amarelo. A mais energizante dentre as cores quentes pode ser percebida nos cenários, cartazes e iluminação usadas no longa.


O kimono e o próprio ator Kenji Ohba, que interpretou um dos heróis da série japonesa de 1982, Space Cop, se parecem tanto com a camiseta usada por Charlie Brown, que um dos loucos apelida-o com o nome do personagem criado por Charlie Schulz.



Além de evocar os tons usados  pelo pugilista Butch em seu longa dos anos 90 - que parece ter sido basicamente composto pela estilista Betsy Heimann a partir do robe usado pelo protagonista em Rocky (1976) -, o uniforme amarelo com listras pretas usado por Uma Thurman foi espelhado no macacão de Bruce Lee em Jogo da Morte (1978). Essas cores representam para os japoneses traição e poder, adotadas como identidade visual e símbolo de vingança da personagem principal em KB. 

Bruce Willis/ Sylvester Stallone

Uma Thurman/Bruce Lee

Curiosidades de Kill Bill vol.1 y 2
 Nas suas sapatilhas dá pra ler a frase 'fuck u'. Fiquei querendo.

O vermelho também é fundamental para representar o ódio e necessidade de liberação de tais emoções, presente tanto no banho de sangue provocado pela noiva quanto nas luvas de boxe de Bruce Willis e StalloneEu recomendo assistir à este vídeo, muito bem montado, em que figuram algumas obras de Tarantino, demonstrando a forma como o cinema mexe com nossas emoções e percepções através das cores escolhidas em cena.

Kill Bill Vol. 1 - Quentin Tarantino:

Dirigido por Sejun Sukuzi, o longa Tóquio Violenta (1966) apresenta cenários e cores planejados de forma cuidadosa, tendo certamente influenciado a estética de KB, com uso excessivo de amarelo, vermelho e branco, assim como algumas cenas de luta.





Os membros da equipe comandada por O-Ren - introduzidos pela mesma música de Battles Without Honor and Humanity (2000) composta por Tomayasu Hotei assemelham-se aos de Fudoh (1966) e Black Lizard (1968). No filme Shikoku (1999), o número 88 representa todo o mal do mundo, defendendo que para livrar-se dele a protagonista deve empenhar-se em uma jornada de à 88 templos budistas. 


Eles foram inspirados na máfia japonesa, uma das maiores organizações criminais mundialmente famosa por seus costumes e códigos de conduta, detentora de grande controle sobre a indústria pornográfica do país, inclusive a infantil. Eles são vistos por muitos de maneira favorável, no entanto, já que também dedicam-se à 'roubar dos ricos e dar aos pobres', às maneiras do famoso Robin Hood. Em 2011, quando o país foi devastado pelo tsunami, eles empenharam-se em entregar carregamentos de comida, água, cobertores e suprimentos de higiene, agindo de forma mais eficaz do que o próprio governo.

                                                      O líder Kazuo Taoka e os mafiosos.

As coreografias de luta dos dois volumes ficaram por conta  de Yuen Woo-ping, influente diretor do cinema chinês, assim como seu pai que foi mentor de estrelas de kung fu como Jackie Chan. O diretor e coreógrafo chinês também colaborou na série Matrix e em Mestre das Armas (2006), além de ser premiado pela coreografia criada para o filme O Tigre e o Dragão (2000) no Golden Horse Film Festival and Awards, em Taiwan. Todo o elenco fez parte de um duro treinamento nas artes do kung fu e do kenjutsu, com duração de cerca de 3 meses, além de aprenderem a manejar diferentes armas de combate. Tarantino aproveitou para fazer aulas com os atores e fazer uma aparição como um dos 88 loucos.


Grande fã do cinema nipônico, Tarantino não apenas fez uma dedicatória ao japonês Kinji Fukasaku, como escalou a atriz de Battle Royale (2000), Chiaki Kuriyama (que assim como Beatrix veste uma jaqueta amarela na pele de Takako Chigusa) para interpretar a personagem Gogo Yubari. A cena em que ela pergunta à um homem em um bar se ele ainda deseja 'penetrá-la' ao esfaquear sua virilha é uma recriação do filme de Fukasaku. A japonesa também aparece em Shikoku de Nagasaki.

     Acima Chiaki em Kill Bill e abaixo em Battle Royale.


A guarda-costas colegial insana de O-Ren tem seu nome derivado do anime japonês Mach GoGoGo (Speed Racer), do qual o diretor gostava quando criança, assim como uma pequena cidade do norte do país famosa pela sétima arte. O herói Musashi luta contra o vilão Baiken, que usa uma foice, uma corrente e uma bola. Ela também foi inspirada nas colegiais guerreiras de Sukeban Deka, mangá do autor Shinji Wada. A história absurda na qual as personagens usam como armas bolas de gude, ioiôs e correntes, foi adaptada para uma série de animação e se tornou um filme japonês em 1987.



O jeito que Gogo enlaça o pescoço da noiva com a corrente de sua arma, referencia uma cena de Black Mama, White Mama (1973) e do horror Prelúdio para Matar (1975), de Dario Argento. Já a sequência dos olhos escorrendo sangue foi tirada de dois filmes de exploitation trash italianos filmados em 1980: Cidade dos Mortos Vivos de Umberto Lenzi e Pavor na Cidade dos Zumbis de Lucio Fulci.



 Chiaki acima, seguida de Laura Trotter e Tommy Fisher mais abaixo

As cenas de combate lembram as de Ninja Assassino (1980) de Robert Houston, produzido com uma trilha sonora um tanto quanto bizarra e narração em inglês. Tarantino também foi influenciado pelo clássico protagonizado por Chiba em 1974, Street Fighter: A Vingança (abaixo), de outro diretor japonês.


Igualmente protagonizados por Bruce Lee, O Dragão Chinês (1971) e Fúria do Dragão (1972), dirigidos por Lo Wei, são referenciados nas cenas de luta que a personagem de Thurman trava com os yakuza. A atriz evitou o uso de dublês, protagonizando a maioria das acrobacias de ação. 

Curiosidades de Kill Bill vol.1 y 2


O diretor teve que deixar em preto e branco as cenas mais sangrentas na versão americana, afim de que a sequência não fosse censurada, aproveitando o recurso para fazer uma homenagem às exibições nos EUA de séries de kung fu dos anos 70 e 80, como a versão para o país de Bao Chou (1970).

Curiosidades de Kill Bill vol.1 y 2

O thriller do diretor Toshyia Fujita é tanto ou mais violento que o de Tarantino, obviamente um grande fã do gênero trash, utilizando-se de muitos esguichos sangrentos e mutilações absurdas.


A cena em que vê-se apenas a silhueta dos lutadores com fundo colorido, faz referência ao longa de comédia Samurai Fiction (1998), dirigido por Hiroyuki Nakano. O nome do restaurante "House Of Blue Leaves" é o mesmo de uma peça americana de 1948.


Além da reprodução de várias cenas do longa, figurino e cenários, a bela música usada na cena da morte de O-Ren é a mesma inclusa na trilha sonora do filme dos anos 70, cantada por Meiko Kaji : Flower of Carnage (Shura no Hana). Além do duelo entre Lady Snowblood e uma de suas vítimas, a batalha lembra as cenas de luta no início de Sex and Fury (1973).

Lucy Liu em Kill Bill


Lady Snowblood

Decorrem exatamente 4 minutos e 59 minutos entre a fala de Lucy Liu antes do confronto - "Espero que você tenha poupado sua energia. Se não tiver, você provavelmente não vai durar nem 5 minutos" - e a cena em que ela cai na neve.

Cena na neve de Kill Bill acima e de Lady Snowblood abaixo

Um detalhe que sempre figura nos filmes de Tarantino são tomadas feitas da perspectiva de um porta-malas, aqui assumindo o ponto-de-vista da seguidora mutilada de O-Ren, Sofie.

                       "That woman deserves her revenge and we deserve to die."


Lista dos Filmes citados neste post

A Mulher do Fazendeiro (1928)
Dr. Gogol O Médico Louco (1935)
Cidadão Kane (1941)
Fighting Back (1948)
Scaramouche (1952)
Samurai II : Duelo no Templo Ichijoji (1955)  
Asas de Águias (1957)
Atirem no Pianista (1960)
Sanjuro (1962) - Kurosawa
Zatoichi (1962) 
Por um Punhado de Dólares (1964)
Marnie, confissões de uma ladra (1964)
Faster, Pussycat! Kill! Kill! (1965) 
Fudoh (1966)
Tóquio Violenta (1966)
A Morte Anda a Cavalo (1966)
Três Homens em Conflito (1966) 
A Invasão dos Gargântuas (1966) 
O Despertar dos Monstros (1968)
O Escândalo (1967)
Black Lizard (1968)
Goke (1968) - Hajime Satô
A Morte tem Cara de Anjo (1968)
A Noiva de Preto (1968)
Os Violentos vão para o Inferno (1968)
Hannie Caulder - Desejo de Vingança (1971)
O Dragão Chinês (1971)
Fúria do Dragão (1972) 
Female Prisoner #701: Scorpion (1972)
Lobo Solitário III : Contra os Ventos da Morte (1972)
La Novia Ensangrentada (1972)
Sex and Fury (1973)
Coffy: em Busca de Vingança (1973)
Lady Snowblood (1973)
Black Mama, White Mama (1973) 
Street Fighter: A Vingança (1974)
Thriller - Um Filme Cruel (1974)
60 Segundos (1974)
Faca na Garganta (1975) 
Prelúdio para Matar (1975) 
Carrie (1976)
Premonição (1977)
Eaten Alive (1977)
Domingo Negro (1977)
Patrick (1978)
Jogo da Morte (1978)
Os Cinco Venenos de Shaolin (1978)
Grease (1978)
Ninja Assassino (1980)
Cidade dos Mortos Vivos (1980) 
Pavor na Cidade dos Zumbis (1980) 
Portal do Inferno (1981) 
Star Trek : A Ira de Khan (1982)
Junkman (1982) - Halicki
Blade Runner (1984)
Sukeban Deka (1987)
O Matador (1989) 
Cães de Aluguel (1992)
Amor à Queima Roupa (1993)
Pulp Fiction (1994)
Um Drink no Inferno (1996)
Jackie Brown (1997)
Samurai Fiction (1998)
Shikoku (1999)
Audition (1999)
Battles Without Honor and Humanity (2000)
Battle Royale (2000)
Bater ou Correr (2000)
Ichi, O Assassino (2001)
Godzilla (2001)
Abhay (2001)
The Making Of Kill Bill (2003)

Animações longa-metragem
O Fantasma do Futuro (1995) 
 Blood: The Last Vampire (2000)

Séries
Mach GoGoGo (Speed Racer)
Peanuts
Besouro Verde  - anos 60
Ironside (1967)
Bao Chou (1970)

Kage No Gundam (1980)
Space Cop (1982)
Os Simpsons

Diretores
Chang Cheh

Outras referências
Capitão América (HQ)
Ep. Breakdown (1955) - Alfred Hitchcock Presents

Outros Filmes
Psicose (1960)
Taxi Driver (1976).
Olhos de Serpente (1998)
Matrix
O Tigre e o Dragão (2000)
Shinobi (2005)
Mestre das Armas (2006)
Vestida para Casar (2008)
Whip It (2009) 
Grey Gardens (2009)
Paixão (2012)




Fonte:
http://www.comingsoon.net/
http://www.taringa.net/
http://www.businessinsider.com.au/
http://www.megacurioso.com.br/
http://www.jackincongruente.com/
http://fabriciobezerradaguia.blogspot.com.br/
http://cinema.uol.com.br/
http://www.garotasgeeks.com/
http://imgur.com/
http://figurinofashion.blogspot.com.br/
https://popculture2013.wordpress.com/
https://www.buzzfeed.com/
http://www.phrases.org.uk/
http://wiki.tarantino.info/
http://usesensorial.com.br/
http://uproxx.com/

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Afetado por uma maldição enquanto defendia seu vilarejo de um demônio vingativo, o príncipe Ashitaka deixa seu povo e parte atrás de uma cura. Ele encontra em seu caminho uma aldeia de mineradores de ferro que travam uma guerra contra a Princesa Mononoke e os deuses-animais.  Confesso ter demorado para conferir o trabalho do prolífico e aclamado Miyazaki , mas quando finalmente assisti à essa bem sucedida produção dos estúdios Ghibli, não fiquei nem um pouco decepcionada. Os filmes do diretor japonês costumam tratar sobre a relação da humanidade com a natureza, misturando folclore oriental, tecnologia e protagonistas fortes,  na sua grande maioria femininas. Fiquei bastante impactada pela qualidade estética do longa, detalhes e cores utilizadas, além da belíssima trilha sonora assinada pelo compositor e diretor musical Joe Hisaishi , outro gênio a ser aplaudido de pé. Não só os protagonistas, como a antagonista Lady Eboshi, os coadjuvantes, animais e ...

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